domingo, 24 de novembro de 2013

O mito da "grande mídia"

Uma das bandeiras do petismo desmiolado é a falácia amplamente divulgada de que a chamada "grande mídia" (leia-se, Folha, Estadão, Globo e Veja) estaria cooptada pelo reacionarismo da direita, só publicando matérias com viés anti-PT, e protegendo o partido "de direita", que os petistas e seus pau-mandados julgam ser o PSDB. Em que pese o erro crasso quanto ao posicionamento ideológico destes partidos (nada mais de direita do que um PT caudilhesco, ditatorial e amigo íntimo dos setores mais conservadores do empresariado da FIESP e FEBRABAN), a acusação até ganha adeptos entre alguns que nem se dão ao trabalho de LER o que se publica nesses veículos. De fato, a Veja possui viés à direita. Não é preciso ser um oráculo para perceber isso. E daí? Por mais que se tente demonizar a direita, o fato inequívoco é que a direita respeita valores caros a quem preza a liberdade, como a livre iniciativa, o respeito às leis, a ingerência mínima do Estado perdulario e corrupto na vida do cidadão. Quem acompanha a Veja desde sua primeira edição sabe muito bem que a revista é algoz de governos tanto à esquerda quanto à direita. Durante o governo FHC, a revista publicou inúmeras reportagens denunciando irregularidades no governo. Naquela época, a Veja era brandida em plenário, por políticos petistas, como "prova" de desvios na esfera do PSDB. Mas aí o cenário mudou, o PT ganhou o poder. A Veja seguiu na mesma linha editorial: investigando e denunciando. Só que com muito mais material disponível para trabalhar, na medida em que o PT, uma vez no poder, esmerou-se na arte de produzir escândalos e falcatruas. Aí a revista passou a ser a "vilã". Juntamente com outros veículos, notadamente a Folha de São Paulo e O Globo. Esse seria o triunvirato da "imprensa maligna", contra o qual o PT sonha em instituir a censura no Brasil, na forma de "controle social da mídia".

Mas... espera aí. Será que Folha e Globo são tão anti-PT assim? Os veículos das Organizações Globo, há muito tempo incorporaram um viés tão descaradamente pró-PT que chega a assustar. Não me arrisco a afirmar que o apoio do banco oficial BNDES ao grupo foi fator decisivo nessa mudança de maré. Mas que foi estranho, isso foi. Quanto à Folha... não há uma única edição em que não aparece algo da lavra de um petista dos mais empedernidos. Se, por um lado, a Folha colocou o Reinaldo Azevedo como colunista, por outro, segue com umas figuras que chegam a ser caricatas nas suas diatribes de petismo exacerbado. Então, que "grande mídia" é essa, que publica artigos como o do ex-porta-voz do governo Lula, André Singer, um festival de delinquência intelectual sem tamanho, e que saiu no dia 22 de novembro? 

Vou transcrever o artigo, e comentar. 

"Numa atitude que vem se tornando recorrente, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, mais uma vez usou as prerrogativas de que dispõe para conturbar o delicado ambiente que envolve a ação penal 470. A maneira pela qual decidiu o início da execução das sentenças parece obedecer mais a fins de publicidade do que a necessidades objetivas."

Bem, aí é mero exercício do direito de ter opinião. O Singer acha que Barbosa tem como meta primordial na vida "conturbar" a AP 470. Eu vejo por uma ótica diferente. Barbosa quer é encerrar logo essa Ação. No meu entender, uma ação criminal se encerra quando lavra-se a sentença, publica-se, considera transitado em julgado e executa-se. Só faltava executar. Foi o que fez o Ministro Joaquim Barbosa, dentro de suas prerrogativas - e obrigações, diga-se de passagem. 

"Não se questiona aqui que condenações transitadas em julgado fossem executadas, ainda que diversos aspectos do processo permaneçam duvidosos. Mas o "modus faciendi" altera bastante o resultado final, dando conotação de parcialidade aos atos do ministro. Em lugar de amenizar os aspectos espetaculares das medidas, como seria de esperar caso houvesse preocupação profunda com o espírito da lei, ele os potencializou, em uma demonstração de que o janismo pode reaparecer onde menos se espera." 

Ora, se "não se questiona", então, o que vem a ser o artigo do Singer? Em minha visão, ali se "questiona", e muito. A começar pela frase ignóbil: "... ainda que diversos aspectos do processo permaneçam duvidosos". Epa! "duvidosos" coisíssima nenhuma, Singer! As condenações são finais. Não há mais recurso cabível. Transitaram em julgado, como se diz no jargão forense. "Duvidoso" uma ova! No instante em que o jornalista e petista coloca a palavra "duvidoso" no seu texto, ele contradiz frontalmente o enunciado no começo de seu próprio texto! Questiona o inquestionável! Em seguida, ele segue na diatribe, com uma frase que não quer dizer coisa com coisa: "Em lugar de amenizar os aspectos ...". Ah, caro jornalista, me poupe, vai! Ministro do STF não tem que "amenizar" coisa nenhuma! Tem que fazer cumprir a Lei! Pelo visto, Singer endossa a opinião do seu chefe Lula, ao se referir à investigação conduzida pela PF no tocante a José Sarney: "Ele não é uma pessoa qualquer...". Criminoso comum, daquele que te assalta na esquina com o trezoitão na mão, tem que ter todo o rigor da Lei, vai preso sem dó, seja feriado, Natal ou Carnaval, mas político petista tem que ser agraciado com "amenização"?? 

"A entrevista de Marco Aurélio Mello, colega de tribunal, ao jornalista Josias de Souza, não deixa dúvida a respeito. Em primeiro lugar, não havia nenhuma necessidade de açodamento, disse Mello, em relação à execução das sentenças. Acrescente-se que, depois de uma sessão confusa na quarta, 13 de novembro, Barbosa ainda precisava explicar, no dia seguinte, ao plenário, qual era a situação de cada um dos condenados."

Um subterfúgio tacanho. O jornalista não se atreve a dizer que "não havia pressa" na execução das sentenças. Isso pega mal, não é? Afinal de contas, o que o Brasil precisa não é de "lerdeza" nos atos do judiciário, mas justamente o contrário. Aí busca-se a opinião de um membro do Tribunal, para dar substância ao queixume. "Açodamento", Singer? Essa gente deveria estar presa preventivamente. O processo se arrasta desde 2007! Interferiram de forma grotesca no andamento do processo. Um tem até blog para achincalhar o STF. Fossem "presos comuns", estariam presos desde a aceitação da denúncia pelo MPF. Demorou demais, isso sim. Sentença lavrada, é expedir os mandados de prisão e recolher à cadeia. Simples assim.

"Não só não o fez, como, para surpresa geral --o que, aliás, é parte da "síndrome Quadros" que o atinge--, resolveu utilizar um feriado extenso, em que não há notícias para disputar o espaço noticioso nem mobilização para contestar o decidido, e colocar em presídio de segurança de Brasília um trio de altos ex-dirigentes do PT. O fato de ser a data da comemoração da República completa o simbolismo ideal para um possível futuro candidato a chefe do Executivo."

Chega a ser asqueroso! "Mobilização para contestar o decidido"??? Que diabos é isso? Black Blocs nas ruas, pedindo a libertação de Zé Dirceu? Ação judicial não caberia, nem durante o feriado, nem depois. Tanto que não houve. E pra dizer a verdade. nem mobilização alguma, excetuando-se aquela empreendida por blogs sujos financiados com dinheiro público. Ninguém fez passeata pelo "trio de ex-dirigentes do PT". E depois, o Singer tenta imputar a Joaquim Barbosa uma candidatura presidencial inexistente. Alega, sem pudor algum, que o Presidente do STF quer mesmo é a Presidência da República, e que já comete "ilegalidades" para obtê-la! Daqui a um ano, ou mesmo cinco, Joaquim Barbosa seguirá tranquilamente na sua função vitalícia no STF, não sairá candidato coisíssima nenhuma, e onde estará o Singer para assumir que falou besteira?

"Em segundo lugar, afirma Marco Aurélio, Barbosa acabou por produzir uma desnecessária prisão provisória em regime fechado para cidadãos que têm direito ao semiaberto nos lugares em que residem. Caso os devidos ritos fossem cumpridos com calma, teria havido situação bem diferente, com os acusados livres ao menos durante o dia. Assim, além de ser ilegal a reclusão a que estão submetidos José Dirceu e Delúbio Soares, foi ameaçada gratuitamente a integridade de José Genoino, cuja frágil situação de saúde é de todos conhecida."

Quanta bobagem se escreve numa folha de papel, não? Singer crê que o regime semiaberto é aquele no qual o cidadão sai pela manhã da cadeia, dá um tchauzinho, vai cuidar da vida e volta à noite. Ele também acha que isso é automático, uma espécie de direito pétreo desde o primeiro instante. Não é, como qualquer estagiário de direito bem sabe. O regime semiaberto depende de uma série de fatores para ser concedido e implementado. O preso entra no sistema carcerário, e aí, cumpridas as exigências, obtém o regime semiaberto. Singer segue na sua filosofia tosca, dizendo que a prisão dos três petistas-mor é ilegal. Ora, se é ilegal, fica simples: qualquer Ministro do STF pode conceder um habeas-corpus, direito pétreo da Constituição, revogando o ato "ilegal" do Ministro Joaquim Barbosa. Não se iludam: se nenhum dos Ministros o fez, é porque não podem. Não podem porque sabem muito bem que as prisões são perfeitamente legais. E, francamente, usar o estado de saúde de José Genoíno como alavancagem para a inoperância da justiça, é de amargar. Ninguém teve a mesma disposição para aliviar a barra de centenas, milhares talvez, de criminosos hipertensos mofando nos presídios brasileiros, não é? Só o coitadinho do José Genoíno teria esse privilégio? Por que?

"A concessão de tratamento em hospital ou domicílio a Genoino, anteontem, começou a reparar a série de abusos praticados no aparente intuito de causar sensação. Passada a fervura midiática e com a aparição de vozes divergentes em cena, espera-se que os demais atropelos também sejam corrigidos. Fica, no entanto, a impressão de que há um incendiário no comando, o que lança dúvidas sobre a condução que impôs a todo processo anterior."

Por fim, o jornalista tenta "redimir" o STF, que teria acatado o raciocínio lógico de permitir que o José Genoíno recebesse tratamento médico num hospital. De forma conveniente, ocultou o fato de que quem concedeu esse "benefício" foi precisamente o Joaquim Barbosa. Não porque se rendesse às pressões, mas por uma razão bem mais simples: ele recebeu um laudo médico oficial que recomendava essa ação. Aí o Singer faz aquilo que se esperava dele, como bom petista: pegou carona no José Genoíno, e pediu a libertação dos demais criminosos do seu partido. E, numa pérola final, volta a atacar o processo todo. É asqueroso.

Duas considerações adicionais se fazem importantes aqui. Primeiro, não é de se estranhar a postura aguerrida do PT e de seus verdugos a soldo, na defesa de José Dirceu, Delúbio Soares e José Genoíno, os três mosqueteiros (ou patetas, para muitos) do petismo. A grita é ensurdecedora! Mas... e os outros? E o Marcos Valério? A Kátia Rabello? Ninguém vai pedir a liberdade deles? Ninguém aí vai dizer que as penas deles foram severas demais (eu pessoalmente acho que foram, se comparada com a dos mandantes do esquema criminoso)? Ninguém aí foi ver se Marcos Valério bebia água de torneira? Quanta injustiça! Quanta ingratidão!  Segundo, existe uma forma de "resolver" essa questão de uma forma definitiva. Basta que a presidente Dilma Rousseff saque de sua caneta presidencial, e conceda indulto a José Genoíno. A Lei é clara: O decreto em vigor prevê perdão a presos que exijam cuidados especiais por questão de saúde. Por que ela não o faz? Não sei... mas desconfio que embora seja inepta e limitada intelectualmente, a Dilma não é boba. E não vai comprar uma briga com a vontade popular a um ano das eleições. E o povo, caso alguns não saibam, quer mesmo é que a quadrilha do Mensalão fique presa. Por muito tempo, se possível.