sábado, 18 de agosto de 2012

Brasil: nossa sina é a mediocridade?

Acabaram-se as Olimpíadas. Mais uma vez, repetiu-se o caminho tantas vezes trilhado em edições anteriores do maior evento mundial do esporte (há quem discorde disso, claro): o Brasil, com seus 190 milhões de habitantes, e uma delegação que ocuparia um Airbus 340 inteirinho (está certo, atletas mesmo foram 257, mas quantos não-atletas entraram no avião, pegando carona no evento?), volta de Londres com uma coleção de 17 medalhas, sendo 3 de ouro. O país que se ufana de ser a sexta economia do mundo, a depender do câmbio do dia, ficou em 22° lugar na competição, entre a Espanha e a África do Sul. Ficamos atrás da Nova Zelândia (15°) mas, ufa!, terminamos à frente da Etiópia (24°).  O resultado, um recorde de medalhas em Olimpíadas, foi saudado como uma vitória, e a prova da evolução dos esportes no Brasil.

A presidente Dilma Rousseff, nessa semana, cobrou do Brasil mais medalhas para 2016, afirmando que o país deve "buscar o aumento da quantidade de medalhas para a Olimpíada do Rio de Janeiro, daqui a quatro anos". Ela declinou de explicar como pretende atingir esse objetivo, ou de como pretende fazer com que alguém faça a mágica de multiplicar as medalhas brasileiras. Mas quer mais medalhas. Ela, eu e a torcida em geral. Somos só isso, torcida. É o retrato do Brasil.

Tem algo errado nesse retrato!

Nem vou comentar a respeito das afirmações da Dilma. O que essa gente fala não se escreve, como é sabido. "Cobrar" mais medalhas é pura figura de retórica, bazófia, papo-furado, conversa para boi dormir. Cobrar é fácil. Se não cumprir nada do "cobrado", fica tudo por isso mesmo, e estamos conversados. Fica para 2020, 2024... e assim vai. O que o governo vai fazer, de fato, para alavancar essa quantidade de medalhas? Mais do mesmo? Já vimos o resultado disso.

O que salta aos olhos na coisa toda, é que o Brasil, em que pese o mérito individual e coletivo de muitos de seus atletas, é uma nulidade no esporte olímpico mundial. Podemos até achar que somos bons nisso ou naquilo, e nos enchemos de esperanças vãs quando fazemos boa figura nos Jogos Pan-americanos, talvez desprezando o fato de que os Jogos das Américas são vistos como mero aquecimento para o evento principal pelas potências continentais do esporte, notadamente os Estados Unidos. 

Então vejamos. O Brasil, que tem quase 200 milhões de habitantes, e a única potência econômica ao sul do Equador, manda 257 atletas para Londres, e colhe 17 medalhas. Os Estados Unidos mandam 480 atletas para lá, e voltam com 104 medalhas, sendo quase a metade de ouro. Está certo... os EUA não são um bom parâmetro - lá, o esporte é levado a sério. Peguemos a Hungria, então. Mandou a Londres 75 atletas. Faturou as mesmas 17 medalhas da equipe brasileira, só que 8 foram de ouro, o que deixou o país em nono no quadro. E a Nova Zelândia? Eu nem imaginava que neozelandeses praticasse algo no mundo do esporte.. pois bem, os atletas de lá trouxeram 6 medalhas de ouro, sendo 3 na canoagem. Ah, mas é canoagem, né? É... mas pelo menos os neozelandeses são BONS em alguma coisa. E o Brasil? O Brasil é bom em que, mesmo? A sexta economia mundial faz o que em termos esportivos, depois que o futebol foi despencando, despencando no ranking mundial? Ah, temos o vôlei, está certo. A salvação da lavoura. Viva o vôlei, então!

Uma só palavra define bem o papel que o Brasil desempenhou nas Olimpíadas: Mediocridade. Antes que me acusem de antipatriótico e outras bobagens, esclareço que ver a realidade nunca foi falta de amor à camisa e ao país onde nasci. Eu adoraria ver o Brasil brigando de igual para igual com Itália, França, Coréia ou mesmo Hungria. Mas já reza a sabedoria popular: não se pode tirar algo de quem não o tem. E o Brasil, sinto muito, não tem vocação para a coisa. 

Ou será que tem?

Segundo a propaganda governamental, o Brasil é o país do esporte. Nas páginas das revistas semanais, o que mais se vê são propagandas de estatais alardeando seu suporte e patrocínio ao esporte. Não há uma escola pública sem uma quadra de esportes. O esporte é o assunto do dia, em qualquer conversa. 

E porque não somos uma potência nisso?

Em minha opinião, é uma questão de prioridade. De política. E por mais que os mandatários afirmem que o esporte é prioridade, sinto muito, mas não passa de engodo. De mentira. Criam até um Ministério do Esporte, que, a exemplo da jabuticaba, é algo que só existe mesmo por aqui. Mas o Ministério do Esporte faz exatamente o que, na promoção real do esporte nacional? Não é segredo que o Ministério do Esporte, a exemplo de vários outros, possui uma função muito mais política, de acomodar aliados do governo do momento, de que de efetivamente dar prioridade ao esporte. 

E isso, por mais estranho que possa parecer, não é grave. Grave é a empulhação, a mentira de afirmar aos quatro ventos que o Brasil dá uma importância ao esporte, que na verdade não dá. Se o esporte fosse realmente prioritário por aqui, ele não ficaria à mercê de patrocínios esporádicos e interesseiros. Não que os patrocínios sejam ruins, longe disso. Mas não se pode construir uma base consistente de política esportiva calçada em patrocínios que, em última análise, dependem do humor dos departamentos de marketing de empresas, sejam públicas ou privadas. É preciso algo mais. É preciso uma política para o esporte, que promova o surgimento de atletas de padrão internacional, entre nossos quase 200 milhões de brasileiros. Vejamos o caso da Índia. Um subcontinente inteiro, cerca de um bilhão de pessoas, economia forte, um dos BRICS, e a Índia simplesmente não dá a mínima para as Olimpíadas. Obteve 6 medalhas, nenhuma de ouro, após mandar 83 atletas a Londres. Por que? Ora, porque a Índia não coloca o esporte como parâmetro de desenvolvimento. Nem seu vizinho também de proporções continentais, a Indonésia, que se contentou com 2 medalhas. A Índia não dá, por razões culturais, a mesma importância ao esporte, que é dado em outras partes do mundo. É uma opção. Em compensação, tem 10, isso mesmo, dez contemplados com o Prêmio Nobel. Tirando o prêmio dado à Madre Teresa de Calcutá, são 9 Nobel, nos campos de Literatura, Física, Química e Medicina. Em termos de Nobel, a Índia nos aplica uma surra de 10 a zero, uma vez que por aqui, a premiação sueca de mérito e excelência acadêmica e científica passou longe. Cada um elege as prioridades que quer. Eu mesmo ficaria muito mais orgulhoso de meu país se ele tivesse Prêmios Nobel (um só já seria um começo) e nenhuma medalha olímpica.

Esse é o mal do Brasil: somos medíocres no esporte, e uma nulidade na ciência. O que nos resta? Existe algum prêmio internacional para tamanho de nádegas? Seríamos imbatíveis! Outra premiação inevitável seria num hipotético campeonato de baixaria na televisão. Poucos rivalizariam com a profusão de indignidades que grassa na nossa telinha. E, e claro, caso alguma Academia ligada à Máfia concedesse um prêmio para sem-vergonhice na gestão pública, ninguém nos tiraria do lugar mais alto do pódio, muito embora a concorrência fosse acirrada. Um "Prêmio Nobel da Corrupção" devolveria em forma de medalhas um pouco do ouro surrupiado por séculos de malandragem tupiniquim.

Como essas categorias de atividade humana ainda não ganharam status olímpico, resta-nos a opção pela mediocridade, então? É a nossa sina inevitável?

Não, eu não acredito que seja. Mas entre achar que existe solução para nossa inapetência esportiva e intelectual, e acreditar que a solução possa ser implementada num país tão refém de fisiologismo como o Brasil, há uma distância enorme. Porque se a solução existe, ela não é confortável, nem indolor. E o brasileiro, esse ser tropical no estilo Macunaíma, aguenta a desonra, a vergonha, mas não a dor. 

A solução, para quem se interessar em saber, se chama "reforma universitária". Porque as Universidades possuem uma peculiaridade única: são instituições que podem (e deveriam) produzir mais do que esse monte de bacharéis despreparados que vomitam no mercado de trabalho a cada ano. As universidades concentram tanto a força física de milhões de pessoas no auge do vigor físico, quanto milhões de jovens que, ao menos teoricamente, tem sede de conhecimento, e curiosidade suficiente para buscar respostas. Nos Estados Unidos, essa feliz coincidência já foi percebida há mais de um século, e as universidades de lá, muito mais do que simples instituições produtoras de diplomas, viraram fábricas de mentes brilhantes, pesquisas avançadas e, porque não, esportistas de padrão olímpico. O esporte olímpico americano, com raras exceções, é esporte universitário. E como se chegou a isso? Simples, mas doloroso para a mentalidade paternalista brasileira: universidades PAGAS. 

Certamente essa palavra provocará urticária nos esquerdistas de botequim que adoram quando o Estado transforma impostos escorchantes em serviços pífios. Talvez porque ao longo desse longo caminho entre a arrecadação e o pagamento daquilo que interessa, surjam inúmeras oportunidades de tirar uma lasquinha em forma de comissões, propinas e corrupção de modo geral. Nada é mais ineficiente do que o caminho do "welfare state" sustentado por impostos, num país onde a moralidade pública anda tão por baixo quanto o nosso.

Hoje, o que temos? Universidades federais, públicas, sustentadas por dotação orçamentária (leia-se, impostos). Onde o ensino é, por força de lei, gratuito. Em que pesem suas deficiências, são a elite do ensino superior. Muitas são como torres de marfim, fechadas em si mesmas, com pouca ou nenhuma influência positiva nas comunidades ao seu redor. E quem frequenta essas escolas? Ora, não tenham dúvida: a elite. Gente cujos pais tem recursos para pagar cursinhos caríssimos, para habilitá-los a enfrentar com sucesso um processo seletivo onde alijarão dezenas de outros candidatos, muitos dos quais são potencialmente mais qualificados do que eles, mas que não tiveram acesso a cursinhos cheios de "marretas". Ocorre então a inversão nefasta daquilo que se propõe com a escola pública gratuita: quem nada paga, é quem poderia pagar. E quem não pode pagar resigna-se às faculdades particulares, que são pagas - e caras. Pelo menos as de qualidade aceitável são. É a perversão sócio-educacional. Aí vem o governo, e, num esforço "indolor" para equalizar as coisas, inventa ações afirmativas que, se possuem o duvidoso mérito de dar acesso a segmentos escolhidos da população, jogam o objetivo primordial de qualquer universidade que se preza no esgoto. Criam-se cotas de acesso, uma excrescência que joga no lixo aquele que deveria ser o único, repito, único critério para acesso a uma universidade: o mérito. Vagas são reservadas para afrodescendentes, para outras minorias, para oriundos de escola pública, para tudo quanto é grupo de pressão que possa ter voz em Brasília. Os demais, pessoas comuns, irão disputar vagas cada vez mais raras, para ter ensino cada vez pior. Terão que se adaptar à mediocridade de quem entrou na universidade não por seus méritos, mas por características étnicas, num racismo às avessas tão abominável quanto desastroso para o resultado final pretendido: a qualidade de ensino.

Que tal jogar tudo isso no lixo?

Que tal instituirmos Universidades Públicas, tanto Federais como Estaduais, pagas, em valores compatíveis com o custo dos cursos que ministram? "Ah, mas isso vai afastar os pobres de vez..." Não! Não! Pelo contrário! Porque ao mesmo tempo, seriam adotados mecanismos de financiamento desses cursos, que iriam desde o financiamento puro e simples, para devolução parcelada ao final do curso, até isenção total de pagamento, dependendo de certas metas acadêmicas a serem estabelecidas por cada instituição, e confrontadas com a performance acompanhada desde o ingresso na escola. Outra forma de auto-financiamento das mensalidades seria o compromisso de trabalho durante um período previamente estabelecido, em regiões do país carentes de certos profissionais. E, por fim, a bolsa de mérito esportivo, copiando o modelo que tanto sucesso faz nos Estados Unidos. O aluno se inscreve numa modalidade esportiva, com metas de performance pre-definidas, e obtém bolsa integral ou parcial com base no seu mérito nessa atividade. Surge, enfim, o esporte verdadeiramente universitário, base de qualquer sistema olímpico que se preze.

Quais as consequências imediatas de um sistema nesses moldes? Em primeiro lugar,  haveria uma diminuição significativa no "índice de ociosidade" do corpo discente. Com metas a cumprir, sobra menos tempo para a vagabundagem tão cara a estudantes universitários. As famosas festas de varar a noite, numa emulação tropical da mentira apregoada nos filmes da franquia American Pie, ficarão menos frequentadas. É bem provável que os protestos pela legalização da maconha também atraiam menos adeptos. Os ricos poderão se dar a esses luxos, poderão ficar na zona de penumbra entre a obtenção da bolsa e a exclusão por jubilamento, porque, afinal, estão lá pagando. Cada um que estabeleça suas prioridades, ora. Mas quem quiser estudar de graça, vai ter que fazer seu dever de casa. Sou capaz de apostar que sobrarão vagas nas universidades públicas. Não é comum pais da classe média pagarem R$ 2-3 mil por mês, para terem os filhos em marchas da maconha. E com vagas sobrando, para que as cotas? O critério será o de mérito, como é natural e lógico. Ganha o padrão de ensino. Ganham as universidades, que terão recursos para pagar melhor os docentes, e financiar pesquisas - um passo importante no rumo de prêmios Nobel. Essa é a verdadeira Autonomia Universitária, não aquela advogada pelos maconheiros da USP, que se limita a impedir a ação da polícia nos campi. Ganham os alunos, todos os alunos, que terão aquilo que vieram buscar na escola: ensino de excelência. Ganha a sociedade. 

E de quebra, o Brasil, além de ter um ensino superior de primeiro mundo, pode começar a pensar em se tornar algo além de um coadjuvante no cenário esportivo olímpico.

Vai doer? Vai... mas o remédio é dos bons. As medalhas e os Prêmio Nobel recebidos pelos atletas e cientistas americanos são a prova de que o sistema funciona - pois é exatamente o que é adotado lá, há muitas décadas. O Brasil ganharia muito se deixasse a soberba esquerdista de lado, e fizesse o mesmo.

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