sábado, 6 de outubro de 2012

Patriota acha que inventou um neologismo. Inventou nada!

Uma das saias-justas mais comuns aos políticos e simpatizantes daquilo que se convencionou chamar de "esquerda" (mas que na verdade é apenas anti-americanismo bobo) ocorre quando alguém lhes faz duas perguntas cujas respostas, se dadas com sinceridade (algo difícil, mas não impossível), resultam num paradoxo, ou melhor, numa contradição em termos. Assim, ó: 

1) Você é a favor da democracia, e contra a ditadura?
2) Você apóia os governos da Venezuela, Cuba, Coréia do Norte?

Para a primeira pergunta, a resposta é, invariavelmente, SIM. Poucos dirão que são a favor de uma boa e velha ditadura. Até mesmo uma turma que pegou em armas nos "anos de chumbo" com o objetivo mais do que explícito de implantar uma ditadura marxista-leninista no Brasil, dirão que "estavam lutando pela democracia". Uma ova. Uns irão mais longe, dizendo bobagens colossais como "os EUA são uma ditadura" (ouvi essa dias atrás). É na hora da segunda pergunta que o caldo entorna. Se são tão democratas assim, como aceitam e endossam os regimes cubano e norte-coreano? Como podem fechar os olhos para a repressão política existe nesses países? Há muitos casos, sendo um dos mais eloquentes a paixão desmesurada que Chico Buarque devota a Cuba (não consta que ele tenciona mudar para lá, lástima). De modo geral, os esquerdopatas gaguejam qualquer coisa nessa hora, acusam a gente de estar a serviço do "PiG", e encerram o debate ali mesmo. 

Alguém fez a pergunta incômoda ontem, ao Chanceler Antonio Patriota, o sujeito que, pelo menos em tese, é a nossa autoridade máxima na seara diplomática. Numa palestra do chanceler na Casa do Saber, no Rio de Janeiro, na noite de sexta-feira, surgiu a pergunta indigesta: "A Venezuela pode ser considerada uma democracia plena?"

Como bem sabem até as pedras da calçada, a Venezuela é um país onde o presidente, ao longo de sucessivas alterações na Constituição, aprovadas por um Congresso manipulado e referendadas por um Supremo Tribunal totalmente aparelhado pelo chavismo, que o transformaram, na prática, em ditador. Ou, usando uma expressão antiga, em "déspota esclarecido". Ele amordaça a imprensa, prende e arrebenta, e não dá sinais de querer largar do poder enquanto vivo estiver. Há um simulacro de oposição, que atualmente ganha força por causa da insatisfação popular com Chávez e seu governo corrupto. Nas eleições presidenciais em curso, existe o risco até de uma derrota de Chávez, desde que não ocorram fraudes. Mas que ninguém se iluda: Chávez sofre do "Mal de Lula" num grau ainda mais profundo, e tolos são aqueles que acham que ele se resignará a ser derrotado nas urnas. Escrevam aí: a oposição não ganha na Venezuela, e na remotíssima possibilidade de ganhar, não leva. A meu ver, não é bem aquilo que se possa qualificar de "democracia", aquela, sabem, no estilo ateniense...

Pois bem. Como acham que o Patriota se saiu dessa?  Ora, nessa hora, ele "inventou" uma definição alternativa para a democracia venezuelana. Leiam o que saiu na Veja On-Line:


"Na noite de sexta-feira, após uma palestra na Casa do Saber, no Rio de Janeiro, a questão caiu novamente sobre o chanceler Antônio Patriota, que participou intensamente da gestão da crise paraguaia, em plena realização da Rio+20, em junho. Acostumado a justificar a relação do governo brasileiro com o regime de Chávez desde quando era embaixador em Washington (2007-2009), Patriota deu seu jeito de responder a uma pergunta incômoda – apesar de já exaustivamente respondida pelo bom senso: A Venezuela pode ser considerada uma democracia plena?
Patriota deu início à explicação isentado Chávez de culpa pela polarização política em seu país, que, segundo descreve, é muito mais intensa do que no Brasil. O chanceler lembrou que Chávez, democraticamente eleito, sofreu uma tentativa de golpe em 2002 — mas não mencionou que Chávez também participou de duas tentativas de golpe antes de ser eleito. Patriota alegou que a oposição venezuelana durante anos se afastou do processo democrático, contestando sua legitimidade, e que retomou a atividade ainda em um ambiente extremamente dividido — como promete ser o pleito do próximo domingo.
Por fim, o ministro saiu-se com essa: “A resposta é que não existe um modelo único de democracia. Existem graus diferentes de amadurecimento democrático. Existem circunstâncias especiais. E o julgamento sobre um país aqui na nossa região, onde subscrevemos cláusulas democráticas (Tratado de Ushuaia, no Mercosul, e carta democrática, da UNASUL), é coletivo e político até certo ponto. Se a região considera que há plena democracia na Venezuela, então há plena democracia na Venezuela. A Unasul poderia ter se reunido, deliberado sobre a Venezuela, e considerado que não havia (plena democracia). Não é essa a opinião da América do Sul. Então é essa a resposta possível. Não é inteiramente satisfatória, mas é a resposta possível”, afirmou.

Uau! O chanceler se superou nessa! Não contente em criar neologismos para definir a pseudo-democracia do país vizinho, ele ainda culpou a oposição pela "polarização" (leia-se: conflito) que grassa na Venezuela. A gente vê algo aqui também, não é? O PT vive alardeando que o problema do Brasil é a oposição "dazelites" golpista, a imprensa golpista, agora tem o STF golpista... Em seguida, colocou a cereja no bolo sentenciando que "se a Unasul diz que lá é uma democracia, então É uma democracia, ora!" Como é que é? Basta a chancela do Unasul, um grupelho de países cujo ideário sobre o tema remonta a "democratas" como Fidel Castro, para dizer o que é e o que não é "democracia"? Ora, faça-me o favor, Chanceler! Mas o melhor ainda estava por vir: o Chanceler tentou criar o neologismo da "Democracia Relativa", que se aplicaria à Venezuela. Epa! Epa! Epa! Alguém precisa avisar ao Patriota que o termo não é exatamente novo. Foi usada - e combatida ferrenhamente pela tímida oposição da época - por Ernesto Geisel, quando inquirido sobre a "democracia brasileira" de 1977. O alemão não era muito dado a democracia absoluta, como se sabe, embora tenha sido o primeiro dos generais-presidentes a efetivamente iniciar um processo de redemocratização, ainda que "lenta e gradual" nas próprias palavras. Patriota faria bem se desse ao autor da neo-definição de democracia o devido crédito.

Como dizem lá na roça: "Essa gente me mata de vergonha!"

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